Proseando - Ao Rio Ouricuri

Esse Rio...

Esse rio não passa na minha rua
A rua, nem se quer existe!
A correnteza forte, leva a enxurrada
Mas, não me leva, me deixa aqui,
Pensando no dia de amanhã
Pensando num alguém.
E esse alguém está na beira do rio
Mas, o rio, oh que rio!
Transborda com suas águas escuras
Que nem sempre mostra a profundeza
Vem canoa, vem na correnteza
Não me deixa aqui tão só
Acaba com a minha tristeza.
Esse rio não tem peixe!
Esse rio é esquisito
Maria bate a tábua de sabão
Inês, tem muitos calos na mão
Genoveva, moça donzela
Acalenta o menino no colo
Filho de uma tia
Primo-irmão
Pensei que fosse filho dela.

E o rio? Será se passou em minha vida?
O sonho é longo, mas o rio é verdadeiro
As canoas sumiram rio abaixo
Os peixes partiram rio acima
A roupa ainda nem secou
Está quarando no varal
Maria chama a menina
Pede a ela que junte tudo
Faça a trouxa e a leve embora
Daqui a pouco escurece
O rio amedronta
A correnteza aumenta
Surucucu pico de jaca
O caminho é longo


Pego o anzol e a farinha
Não esqueço de levar a linha
Ninguém pode perder a hora.

Severino encoivara a roça
A panela de feijão está na fervura
Os cachorros rodeiam a moita
Rompe-Ferro, Rompe-Nuvem, Tubarão!
Atiçados por meu pai
Passam horas e horas ladrando
O facão está amolado
Oh! Menino, tenha cuidado!
Não vá se precipitar
A capivara, está solta,
É caça garantida
Almoço refinado
O cheiro chega longe
A cachorrada faz festa
Com os restos do roedor.

O peixe-frito é quebra jejum
Antes da mesa farta.
E o rio? Continua banhando os corpos?
Nem sei se a água está suja ou barrenta
Cristalina, fria ou cinzenta.
Só sei que daqui por diante
Não navego, não nado e nem atravesso
Antes de verificar
Pois esse rio é encantado
Não sei nem o seu nome
Será se é pau-grosso?
Talvez seja “Capanema”
Aquele que banha a morena
Que veio lá do cafezal
Ou do sítio de onde vem açaí
Soldadinho, pedras, tubão,
Deságua rio formoso!
Passa pelo garrafão
Corre para o mar,
Mas, que mar?
Mostra tua força
Deixa feliz o coração do menino
Chora, estão te agredindo,
Reage, lá vem o veneno
Antes tu eras restrito
Hoje, ninguém te protege.

Eu te protejo!
Fui correndo às cabeceiras
Mostrei a tua nascente
Vi que estás doente
O que será de ti?
Não sei!
O que será de nós?
Sei lá!
Quero te abraçar
Ou melhor, te abraço,
Espero que resistas!
Não desistas!
Não sou teu criador
Sou teu protetor
Conta pra mim a tua história
Vem! Aguça a minha memória
Ouricuri! Já sei, teu nome!
Tu não consegues me enganar
Agora, a canoa vai chegar
Os peixes também já voltaram
Tuas águas clarearam
Estou sonhando novamente?
Nosso povo se esperta
Tu, Ouricuri, estás mais alerta
Fui nas tuas cabeceiras
Lá, tu és magnífico
Tuas águas cristalinas
Nos meus olhos, as meninas
Correnteza abundante
Vou te seguir mais adiante
Solta teu sorriso
Banha tua terra
Festeja com tua gente
Os peixes coloridos
Saborosos, saudáveis
De qualquer jeito
Crus, fritos ou cozidos.

Ouricuri
Tu estás aqui
Não te despedes
Vou chamar a meninada
A tabatinga é verdadeira
A areia dos castelos
E os castelos de areia
Esse rio...ah esse rio...
Quem diria!
Ouricuri, ainda vou te ver
Limpo e preservado
Não estou sonhando
É realidade, estou acordado,
Sonhar não é pecado...
Quero te ver sempre limpo...

......Quem sabe... um dia?


Autor: Paulo Vasconcellos (22.06.2004) - Poema dedicado ao formoso Rio Ouricuri, fazendo sinal de alerta para as agressões que ele sempre sofreu. A composição é do ano de 2004 e até os dias de hoje, nada foi feito para salvar o nosso Rio, instrumento de muitos textos, transformados em poesias e assim por diante. Como diz o texto acima, ainda quero ver o Rio com suas águas límpidas, banhando a querida e amada cidade de Capanema. (PV)

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