Cinema Brasileiro em dupla comemoração
Os dias 05 de novembro e 19 de junho, respectivamente, são lembrados como os dias do cinema brasileiro. Em 05 de novembro de 1896, ocorreu a primeira projeção de filmes no Rio de Janeiro, em salas temporárias, ou seja, lugares adaptados para exibição de filmes. Foi a primeira exibição pública de cinema no país realizada quase um ano depois da sessão histórica dos irmãos Lumière, em Paris, quando foi apresentado publicamente o aparelho cinematógrafo por meio de diversos filmes de curta duração dos Lumière. Em 19 de junho de 1898, Afonso Segreto realizou as primeiras filmagens em solo brasileiro, a partir de um navio, na baía da Guanabara (historiadores consideram que as primeiras gravações brasileiras teriam acontecido em 1897, em Petrópolis).
Nas constantes polêmicas que cercam nosso país, em diversos campos de atuação, ter como referência dois dias do ano como o dia do cinema brasileiro, pode parecer, no mínimo, um exagero. Mas, de certa maneira, é admissível considerar como referências para o cinema brasileiro as datas da primeira exibição de filmes e a primeira filmagem realizada no país. Afinal, ainda precisamos comemorar duplamente a trajetória do cinema nacional, que em todos os anos de sua existência, nos provoca reflexões, pesquisas e valorização de sua trajetória. Entre diversos argumentos para reforçar a necessidade de se comemorar duplamente a existência do cinema nacional, entendo que a principal razão tem relação com o público brasileiro que, infelizmente, mantém-se ,muitas vezes, distante da produção cinematográfica realizada no Brasil.
Para entender a trajetória do cinema nacional e sua relação com o público, é necessário contextualizar suas produções. Os filmes do cinema silencioso (anos 1910 e 1920), em sua maioria, poucas vezes conseguiram chamar atenção dos espectadores. Nesse período, o grande destaque foi Limite (1930) de Mário Peixoto. Felizmente, nos anos 1950, com as comédias protagonizadas por Oscarito e Grande Otelo, foi possível perceber uma intensa aproximação do público por meio das Chanchadas que lotavam os cinemas daquele período e permitiram que produções brasileiras chegassem às salas de cinema nacionais com mais frequência graças aos seus sucessos.
Nos anos 1960, o movimento Cinema Novo, liderado por Glauber Rocha e Nelson Rodrigues dos Santos tornou nosso cinema mais atento a questões políticas e sociais, mas não teve sucessos de público que, raramente prestigiou de modo expressivo a exibição destes filmes nos cinemas. Nos anos 1970, com evidência para os filmes infantis e pornochanchada, o público brasileiro voltou a prestigiar as produções brasileiras, mas sem notar efetivamente o surgimento de novos cineastas e filmes de excelente produção, renomados pela crítica e premiados nacional e internacionalmente.
Nos anos 1980, a proposta de aproximar o cinema nacional por meio de diversos filmes foi bem sucedida, diversas vezes, mas no início dos anos 1990, com a extinção da Empresa Brasileira de Filmes (EMBRAFILME), a produção, distribuição e exibição de filmes brasileiros ficaram comprometidas durante muitos anos. O cinema nacional da retomada de produções e exibições, a partir de 1995, começou a conquistar seu espaço com filmes como Carlota Joaquina (1995) de Carla Camurati e Central do Brasil (1998) de Walter Salles Junior. Neste período, diversos sucessos fortaleceram a relação do cinema nacional com o público.
Nos anos 2000, os desafios continuam. Alguns filmes brasileiros são premiados no exterior, novos e veteranos cineastas realizam filmes de qualidade, mas muitas vezes a distância com o espectador ainda é percebida. A comparação dos filmes nacionais com os filmes estrangeiros, que obviamente têm outras condições de realização incluindo altos investimentos públicos e privados, é injusta. Mas entendo que o mais grave é o preconceito! Avalia-se o cinema nacional por um filme ou dois, de décadas anteriores, e se generaliza seu status de evolução técnica e estética, de maneira incompreensível. Diversas vezes em sala de aula perguntei aos alunos sobre o cinema nacional e muitos não conheciam os filmes mais recentes, assim como os clássicos. Em outras ocasiões, em debates sobre os filmes brasileiros, percebi o pouco interesse de alguns espectadores sobre o que foi realizado no cinema em nosso país.
É preciso novas perspectivas para o cinema brasileiro. Conhecer sua história é um bom começo para se valorizar sua trajetória. Logo, por essa e outras razões, entendo que ainda é necessário celebrar o dia do cinema nacional em duas datas. Quem sabe, um dia, não precisaremos de nenhuma data especifica para saber e lembrar que temos uma bela cinematografia!
Edição: Lucas Brito
Fonte: O Liberal
Texto: Marco Antonio Moreira
Foto: Divulgação
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