Dia do Carimbó: 'Tem que fazer sua história’, diz artesão que dá vida a instrumentos do ritmo paraense

Município de Marapanim celebrou na segunda-feira (5) o Dia Municipal ao tradicional ritmo paraense. Zeca Negrão, de 74 anos, nasceu na cidade conhecida como ‘Terra do Carimbó' '.


Em Marapanim, no nordeste do Pará, ecoa um ruído de serra pelas ruas. O som é do atelier de Zeca Negrão, um artesão que dá vida aos mais variados instrumentos usados no Carimbó. O artista, de 74 anos, entalha alguns produtos para revender na chamada ‘Terra do Carimbó’.

Nesta segunda-feira (5), é comemorado o Dia Municipal do Carimbó na cidade de Marapanim, que realizou um festival de carimbó no fim de semana.

“Esse negócio de carimbó aflorou porque acho que todo marapaniense tem um pouquinho desse DNA, desse conhecimento", afirma.


Ao abrir o portão da sua casa, os primeiros resultados do ofício estão à mostra, na garagem: São peças de madeiras dos mais variados tipos, que retratam os 50 anos de trabalho dedicados exclusivamente à arte por Zeca Negrão.

Ao caminhar pelo espaço onde ficam os artesanatos, Zeca pega um banjo, um dos instrumentos característicos do carimbó, e começa a tocar uma de suas músicas autorais - veja no vídeo acima.

“Comecei fazer pelo Curimbó, que são os mais fáceis. Depois veio as Maracás e na sequência os Milheiros. Por último veio o Banjo, que é o mais complicado de fazer. Você tem que ter um uma técnica e se você errar nas medidas o som não sai”, fala Zeca ao mostrar os instrumentos.



Quanto ao processo de produção, ele diz que dura em torno de três dias, se a madeira já vier pronta.

“As madeiras são geralmente aquelas que quando maduras ficam ocas. Uma é a cirobera, que é uma árvore que dá no mangue. Segundo os mestres mais antigos, é a melhor, por ter um timbre igual do curimbó. As fibras dessa madeira são muito entrelaçadas, então ela prende o som”.

Missão: fazer história

Para Zeca Negrão, a sensação ao ver músicos e mestres de carimbó usando seus instrumentos representa uma missão.

Acho que o ser humano tem uma missão: Você tem que fazer sua história. Alguém vai lembrar quando você já estiver ido e vai lembrar que você teve uma história. Marapanim tem esse clima gostoso pra você explorar o regional e o cultural para mostrar esse trabalho”, afirma.

Zeca sentando em um dos instrumentos usados para tocar o carimbó. — Foto: Marcus Passos/g1

Zeca sentando em um dos instrumentos usados para tocar o carimbó. — Foto: Marcus Passos/g1



Os cerca de 60 artesanatos expostos na garagem são vendidos em uma feirinha realizada todos os fins de semana em Marapanim e dentro de um circuito de carimbó das comunidades.

“São quase quarenta grupos de carimbó que se revezam em cada comunidade da cidade. Ou seja, não mostramos apenas a dança do carimbó mas mostramos alguma coisa que possa lembrar o carimbó. As pessoas querem uma lembrança”, comenta.

Mas, segundo o artesão, os seus trabalhos são mais vendidos sob encomenda. Entre os grupos que usam alguns de seus instrumentos estão o grupo ‘Parceiros do Zimba’ e o ‘Raizes do Paramaú’.

Como começou

Natural de Marapanim, o artista conta que o início do seu trabalho com o artesanato foi a partir de uma outra matéria prima. “Eu comecei a trabalhar com couro aqui na cidade para fornecer para as boutiques de Belém”, relembra.

Fachada da casa do Zeca Negra. — Foto: Marcus Passos/g1

Fachada da casa do Zeca Negra. — Foto: Marcus Passos/g1

A troca das matérias primas ocorreu quando Zeca foi visitar algumas cidades do Nordeste quando tinha 30 anos de idade.

“Fui fazer um estágio no nordeste. Passei seis meses visitando as capitais e os lugares onde se produz artesanato. De lá já vim com outro pensamento, porque lá você trabalha muito em madeira”, afirma.

O artesanato e o carimbó

Peças de madeira feitas por Zeca Negrão que estão à venda. — Foto: Marcus Passos/g1

Peças de madeira feitas por Zeca Negrão que estão à venda. — Foto: Marcus Passos/g1

Zeca Negrão conta que começou a entalhar e gostar de trabalhar com esse tipo de matéria prima, a madeira. Quando perguntado sobre a ligação do artesanato com a produção dos instrumentos do carimbó ele é rápido na resposta.

“Esse negócio de carimbó aflorou, porque é o seguinte: eu acho que todo marapaniense tem um pouquinho desse DNA, desse conhecimento. Vamos dizer assim: todos são autodidata, ninguém aprende em escola”, explica.


Em outras palavras, na terra de Lucindo Rebelo da Costa, o eterno ‘Mestre Lucindo’, todos já carregam um pouco da cultura do carimbó.

A explicação, que ocorria na sua garagem, foi interrompida quando um vento abriu a porta que dava acesso ao restante da casa. Todas as paredes do imóvel repletas de artesanatos feitos à mão.

Atualmente aposentado, Zeca continua a conversa dizendo que o convite para ser presidente de um de um grupo de carimbó foi o impulso que faltava para produzir itens específicos ao tradicional ritmo.

“Convivendo com aquilo lá, com aquele clima, vi que precisava começar a fazer alguma coisa. E aí veio tudo: música, instrumentos. Daí comecei a fazer para vender. Inclusive, tenho muitas músicas do carimbó gravadas. Músicas gravadas pelo grupo ‘Japiim’ e outros grupos daqui”, afirma.

O grupo ‘Japiim’ foi uma das atrações do palco principal do Festival de Carimbó de Marapanim, realizado neste último fim de semana.

Festival de Carimbó

11ª edição do Festival de Carimbó em Marapanim também trouxe um espaço voltado à venda de artesanatos. Zeca Negrão foi um dos expositores, com peças que variavam de instrumentos a lembrancinhas.

Artesão Zeca Negrão vendendo seus produtos na feira de artesanato que ocorre dentro do festival. — Foto: Marcus Passos/g1

Artesão Zeca Negrão vendendo seus produtos na feira de artesanato que ocorre dentro do festival. — Foto: Marcus Passos/g1




Fonte: g1/Pará 

 

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