Dar a Lúcio o que é de Lúcio




Questionar ação meritória é colocar em tese o andar firme de quem tem respaldo para defender causas nobres. O premiado jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto, mais uma vez, figura entre os mais importantes do mundo, principalmente por defender a Amazônia, na qualidade de bom amazônida. Procurar adjetivos para destinar a Lúcio, constitui-se em tarefa difícil, pelo que ele representa para o Pará. A Amazônia é nossa e ninguém tasca! O paraense Lúcio é símbolo do verdadeiro parauara ou simplesmente papa chibé.  (PV)


E, no entanto, se move



Na semana passada fui ao Rio de Janeiro para receber o Prêmio Imprensa Estrangeira de 2012. A Associação dos Correspondentes da Imprensa Estrangeira no Brasil, com sede na antiga capital federal, o criou, em 1989. Devia ser concedida “ao jornalista brasileiro que mais se tenha destacado no ano”.
A primeira concessão foi, entretanto, para o então ministro das Relações Exteriores no iniciante governo Collor, José Francisco Rezek. A exceção é de inspiração mais do que evidente.
Até 2003 o prêmio ficou mais com autoridades do que com jornalistas: de 24 personalidades premiadas, apenas seis eram de fato jornalistas. Ministros, políticos, artistas, ativistas sociais e até o ex-presidente Lula foram escolhidos. De 2004 até agora, porém, o prêmio voltou às origens: todos os premiados foram jornalistas, profissionais com destaque na imprensa nacional, como Míriam Leitão, Alberto Dines, Mino Carta e Zuenir Ventura.
No dia 13 fui o primeiro jornalista da Amazônia a receber o prêmio. A entrega da plaqueta ocorreu numa data feliz: uma nova diretoria assumiu o comando da ACIE e a entidade lançou o seu anuário, publicação eclética de 146 páginas. Ela conta com mais de 283 sócios efetivos, representando 91 empresas jornalísticas de 22 países.
Deve ser um número recorde em matéria de cobertura internacional do Brasil e, quem sabe, da América Latina. Confirma o crescente interesse mundial pelo Brasil e a melhor informação que está procurando. Nenhum jornal ou qualquer órgão da imprensa voltará a declarar Buenos Aires como a capital do nosso país.
A maioria dos correspondentes estrangeiros (162 jornalistas) está agora baseada em São Paulo. O centro econômico-financeiro nacional desbancou o Rio de Janeiro (que abriga 99 correspondentes) como a base principal de trabalho.
Essa mudança se deve certamente à importância econômica que o Brasil assumiu nos últimos tempos, embora tenha perdido nesta semana a tão custosa e demorada 6ª posição no ranking internacional para o Reino Unido, situação sobre a qual gente do governo, como o panglossiano ministro Guido Mantega, deve refletir melhor.
Brasília sedia apenas 22 representantes da imprensa estrangeira, sem dúvida por preferirem as fontes diretas das principais notícias do que a burocracia no poder. A versão oficial perdeu boa parte da sua credibilidade anterior. E os chineses, não por acaso, são os mais interessados em acompanhar o país que lhes fornece matérias primas e insumos básicos fundamentais. A agência estatal de notícias da China tem efetivo menor apenas do que a Associated Press e a Reuters. Mas deverá ultrapassá-las nos próximos anos.
No encontro no Rio, disse aos presentes que me considerava mais um deles. A Amazônia é tão longe, tão distinta do Brasil e é assolada por problemas tão antigos, que viraram memória em lugares mais civilizados do mundo, e ao mesmo tempo tão vanguardistas, que também me sentia como correspondente no estrangeiro.
A pauta amazônica inclui itens como matanças de índios, trabalho escravo, conflitos de terras, destruição maciça da natureza, o maior trem de carga do mundo, a maior fábrica de alumina, a quarta maior hidrelétrica que existe, e etc. e etc.. Situações paradoxais e conflitantes, que raramente são referidas na grande imprensa nacional. Se falta o conhecimento, a desinformação ou a ignorância predominam. Para o Brasil, no apurar das contas, a Amazônia é uma desconhecida para o Brasil.
A acolhida ao discurso que fiz levou o jornalista Lucas Mendes a fazer um comentário a respeito da minha premiação e do meu trabalho (quase como correspondente brasileiro de guerra) no programa Manhattan Connection, que é transmitido de Nova York pela Globo News.
Talvez tenha sido a primeira vez que os clientes da ORM Cabo, que retransmite o programa em Belém do Pará, onde moro, me tenham visto no ar. Verão de novo? Se depender dos donos da TV a cabo, não. Meu nome não pode aparecer nos seus veículos de comunicação. Mesmo que meu Jornal Pessoal divulgue fatos de inquestionável interesse público, os profissionais do império de comunicações da família Maiorana são obrigados a me ignorar.
Não é uma atitude sensata, além de entrar em contradição com a linha editorial que a Rede Globo tem procurado adotar e estimular que seja seguida pelos seus afiliados, como o grupo Liberal no Pará. Mas pelo menos os temas deviam ser retirados desse índex medieval. O resultado dessa cegueira imposta é que não só os brasileiros não conhecem a Amazônia: ela também é uma incógnita para os seus próprios habitantes. A imprensa não se presta ao trabalho de fazer a apresentação.
Ver jornalista do porte de Lucas Mendes se interessar, a partir de Nova York, pelo que faz um repórter do front amazônico, dá uma sensação ao mesmo tempo estranha e reconfortadora. Confirma uma noção que às vezes se torna fantasiosa: de que o mundo gira e a Lusitana roda independentemente dos que se consideram donos da maior fronteira dos recursos naturais do planeta, como se fossem senhores feudais, de baraço e cutelo, com direito sobre a vida e a morte, a fala e o silêncio, o pensamento e o vazio.
Ainda bem que o mundo é maior – e mais atento.
Fonte: Yahoo