Em meio ao isolamento, iniciativas aproximam pessoas por meio da literatura

Redes literários incentivam produção de leituras compartilhadas e bate-papo com escritores


Lucia Bettencourt desembarcou em Paris em setembro de 2019 com o plano de, durante um ano, seguir a trilha de Anita Malfatti pela capital francesa e escrever um livro. É esse o seu projeto de pós-doutorado. "Vim pesquisar a passagem de Anita e os anos loucos e caí no quarto fechado proustiano", brinca, séria, a autora de A Secretária de Borges e de O Regresso confinada, aos 68, em um apartamento perto de Saint Germain des Près, com vista para o pátio interno do prédio.
 
Ela reconhece que poderia aproveitar o isolamento forçado para escrever o romance que, antes do coronavírus, pretendia concluir no fim do ano, mas a quarentena está perturbando sua concentração. É muita notícia, tragédia e ansiedade, mas Lucia encontrou uma âncora: o Sacadas Literárias. "Isso está salvando a minha sanidade. Organizo meu dia a partir disso, procuro um texto bonito que possa ter relevância não só para mim e leio nessa janela que é o meu arzinho de liberdade."
Lucia Bettencourt se refere ao projeto idealizado pelo brasileiro Leonardo Tonus, professor na Universidade de Sorbonne, quando ele se viu obrigado a cancelar a 7ª edição de sua Printemps Littéraire Brésilien, que, neste ano, promoveria o encontro de 70 escritores com estudantes de português e literatura brasileira de universidades e escolas de seis países, na França.
Sacadas Literárias é um projeto informal, explica Tonus, que, para além de assegurar laços sociais e afetivos durante o período de confinamento, tem o objetivo de estimular o prazer da leitura. A ideia surgiu quando ele se deu conta que vários de seus alunos, sobretudo os estrangeiros em intercâmbio, iam passar por esse processo longe de casa e sem acesso a bibliotecas.
O grupo de WhatsApp da turma migrou para uma página do Facebook e outras pessoas, como Lucia - que estava na programação da Primavera Literária -, foram chegando de lugares tão diversos como São Paulo e Dar es Salaam (Tanzânia).
Funciona assim: basta gravar um vídeo com, no máximo, três minutos de leitura de um texto a partir de uma sacada, de uma varanda ou de uma janela e depois postá-lo nas redes sociais (ou enviá-lo para leotonusbr@hotmail.com), usando as hashtags #sacadasliterarias, #balconslittéraires, #literarybalcony.
"Do dia para a noite tomamos consciência dos limites de nossa existência, dos limites da acessibilidade de informação na internet e, por fim, da imprescindibilidade da cultura em nossas vidas. A criação do Sacadas Literárias insere-se na dinâmica de preservação das afetividades, e acredito que literatura pública e compartilhada nos assegura hoje a possibilidade de sobreviver pela troca de afetos, mesmo que à distância", diz Tonus, que já tem novas ideias para ampliar o projeto.
Uma delas é incluir a leitura de atores francófonos, que vão compartilhar textos da literatura francófona contemporânea e da literatura brasileira traduzida em francês. A outra é a criação de um Sacadas Literárias acadêmico que, realizado com a ajuda de colegas universitários, irá distribuir pelas redes sociais conteúdo em literatura para estudantes universitários e do ensino médio.

Ao vivo com escritores

Uma outra rede de literatura reúne escritores, contadores de histórias, mediadores de leitura e voluntários. A Fundação Bungue promove a segunda edição do “Toda História É Uma Carta de Amor”, a partir desta terça-feira (7). 
Trata-se de uma série de lives realizadas na página do Facebook da Fundação Bungue, que ocorrem nos dias 7, 10, 14, 18, 20 e 24 de abril, sempre às 11h.
Confira a programação:
07/04 - Kiusam de Oliveira
10/04 - Cristiano Gouveia
14/04 - Daniel Munduruku
18/04 - Conto em Cantos
20/04 - Rafael de Barros
24/04 - Kiara Terra
Fonte: O Liberal/Cultura (Texto e Foto)

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